08 maio 2009

Capítulo III: Uma questão de honra

-Então, o que é que tinhas para fazer nesta cidade afinal? - Perguntou Makoto, enquanto caminhava lado a lado com Kuroi seguindo uma planta da cidade meio amachucada que lhes tinha sido oferecida no bar. Sochin ia atrás deles, muito calada.
Kuroi hesitou por um segundo.
-A última informação que recebi dizia que um companheiro do meu pai se mudou para esta cidade pouco antes de eu ter sido capturado. Fiz alguma investigação e descobri que ainda aqui vive, por isso é boa ideia ir falar com ele, principalmente porque está em posição para se manter ao corrente de todo o tipo de assuntos. - Respondeu. - Afinal, a máfia é a máfia...
-Queres dizer que o tipo com quem vais falar é um mafioso? - Perguntou Makoto, colocando-se à frente do amigo e obrigando-o a parar. - Mas o que é que tu queres com essa gente?
-Tem calma, rapaz! - Kuroi deu uma palmadinha no ombro de Makoto com um ar de troça. - O meu pai também faz parte da máfia e asseguro-te de que pelo menos os membros desta organização são completamente inofensivos. Eu próprio já fiz parte dela.
Makoto engoliu em seco.
-Não percebo como é que uma família da máfia pode ser inofensiva...
-Digamos que só foi formada para investigar o assassínio da minha mãe sem levantar suspeitas. Se bem que o meu pai parece ter um certo gosto em causar desacatos...
Dito isto o seu sorriso desvaneceu-se e fez uma expressão de aborrecimento.
Makoto percebeu que o amigo não estava com disposição para falar desse assunto e tentou desviar a conversa.
-Então, senpai... onde é que mora essa pessoa?
-Perto do centro da cidade e porque é que me estás a chamar senpai desde que nos levantámos? - Disse Kuroi, voltando-se para o outro com ar indignado.
-Porque, basicamente, ambos fazemos o mesmo. - respondeu com um sorriso aberto. - Eu estou a aprender a lutar, apesar de ainda não seja capaz de fazer nada de jeito...
-Seja... - disse Kuroi com o ar mais resignado do mundo.
-Não lhe ligues, ele às vezes tem ideias que ninguém consegue perceber... - Interrompeu Sochin.
-Eh...? Mas ela estava atrás de nós? - Admirou-se Kuroi, que se voltou para trás. - Nem dei por isso...
Sochin fez uma expressão ofendida e Makoto conteu um risinho.

***

Alguns minutos depois, encontravam-se a atravessar uma rua comprida com muito mau aspecto, e que por sinal não tinha saída.
-Acho que me perdi... - disse Kuroi, dando voltas ao mapa. - Mas porque raio é que esta cidade é tão parecida não importa como viremos o mapa?
"Que idiota... tinha de nos enfiar num beco, de todos os lugares para se estar perdido...", pensou Sochin para consigo. "Para a próxima espero que nos perca num centro comercial."
-Que estranho... - Começou Makoto.
-O que se passa, mano? - Perguntou Sochin, olhando para o irmão.
-Este sítio... não vos parece sinistro?
-Sinistro? Como assim? A mim parece-me um beco completamente normal... - Disse Sochin. - Frio, escuro e sem lojas.
-Não, ele tem razão... - Contrariou Kuroi. - Este sítio é esquisito. Parece que estamos a ser observados.
-Senpai, vamos sair daqui! - Disse Makoto. - Tenho um mau pressentimento!
-Não sejas medricas! Quem é que podia estar aqui assim tão terrível? - Disse a rapariga.
Vindo de cima, ouviram uma gargalhada sarcástica.
-Ponham-se a andar, mariquinhas! - Disse uma voz.
Tentaram ver de onde vinha a voz que parecia de um rapaz, mas era como se se estivesse a mover pelos telhados e não aparecesse em nenhum deles.
-Seja quem for, apareça! - Gritou Kuroi. Sochin abraçou o irmão.
-Bu.
Mesmo à sua frente encontrava-se agora um rapaz mais ou menos da sua altura, com o cabelo preto preso por um lenço e vestido de uma maneira no mínimo estranha. Tinha um sorriso arrogante e estava inclinado para a frente como se esperasse assustar alguém.
-Olha, olha... - disse por fim. - Saiu-me a sorte grande. Em vez de um ratinho, apanho logo três... e um deles é precisamente quem eu queria apanhar na ratoeira!
-Mas o que é que se passa com este anormal...? Aparece do nada e começa a falar em roedores... - Replicou Makoto.
-Cala-te! - Cortou ele. - Seishin, sabias que os teus adorados ex-companheiros não perderam tempo a mandar perseguir-te?
Levou a mão ao bolso e tirou de lá um papel amachucado.
-Neste momento meio mundo anda à tua procura, sabias?
Desembrulhou o papel. Era um recorte de jornal com uma notícia do desaparecimento de Kuroi. Cuspiu para o chão e riu-se como um maníaco.
-Sabes o que está aqui? Sabes? - Continuou. - Diz aqui que a Fighters Union está a oferecer um prémio de 25.000.000 Ari a quem tiver informações sobre ti... - E continuou a rir.
Ignorando-o, Kuroi voltou-se para Makoto e Sochin, apontando para o rapaz por cima do ombro sem se alterar.
-Não liguem ao Genji, ele não regula. - Disse.
Os dois irmãos ficaram a olhar especados.
-Tu conheces este anormal? - Perguntaram em coro.
Kuroi acenou com a cabeça.-Desde que éramos pequenos. Já estava admirado de ele não me vir chatear há tanto tempo...
-Conta-lhes a história toda, idiota! - Gritou Genji, que entretanto parara de rir. - Ou tens vergonha de admitir à frente de uns humanos que eu sou o teu maior rival?
-...De uns humanos?... - Makoto franziu o sobrolho. - E ele é o quê?
-Atrasado mental... - Respondeu Kuroi. - Para te considerar um rival devias ser ao menos capaz de empatar comigo.
Genji rangeu os dentes.
-Lá por isso até te ganho, agora mesmo! - Disse. - Ou tens medo?
Com um ar enfadado, Kuroi enterrou o chapéu na cabeça.
-Vocês os dois afastem-se. Isto não vai ser bonito.
Makoto e Sochin recuaram alguns passos.
"Para quem não gostava de lutar, ele cede depressa.", pensou Sochin, desdenhosa.
Kuroi avançou para Genji a correr e disparou um murro, mas o outro desapareceu no mesmo instante. Olhou rapidamente para trás e atirou um dos pés nessa direcção, inclinando o tronco para a frente. Logo Genji ressurgiu, atingido pelo pontapé, e foi atirado para o chão.
-Devias parar de repetir esse truque. - Disse Kuroi, voltando a equilibrar-se nos dois pés. - Estás a ficar previsível.
-Estava só a aquecer. - Respondeu o outro. Depois, refazendo-se do impacto, levantou-se, agarrado à barriga.
"Aquela maneira de desaparecer... Aquela é a técnica do Kuroi-senpai!", pensou Makoto, engolindo em seco e observando atentamente o desenrolar dos acontecimentos."Mas mais importante... como é que eles conseguem fazer aquilo?"
Kuroi levantou o olhar, calmo, para o rosto de Genji, que acabara de se levantar. Caminhou lentamente para ele, determinado a pôr fim à luta o mais depressa possível.
Genji encostou-se à parede para se manter de pé. Já tinha a respiração ofegante e parecia confuso.
Kuroi aproximou-se e agarrou a gola da sua t-shirt. Este sorriu maliciosamente, agarrou os seus braços e atirou-o contra a parede, dando-lhe um murro.
-Senpai! - Gritou Makoto, abraçando Sochin com força para que ela parasse de tremer.
-Oh, já me tinha esquecido de vocês os dois... - Replicou Genji. - E agora, o que faço com vocês? Acho que não vão ser precisos...
Tirou da mala que trazia um pequeno punhal e girou-o nas mãos despreocupadamente, caminhando para os dois irmãos aterrorizados.
Sochin deu um guincho.
No instante seguinte a cabeça de Genji foi atingida por um pontapé desferido com toda a força.
Kuroi girou os pés no ar, apoiou-se nas mãos e voltou ao chão. Deixara Genji atordoado e sem se mexer.
Os dois irmãos suspiraram de alívio, Sochin limpando uma lágrima de terror que lhe surgira no canto do olho.
-Não nos assustes desta maneira, senpai... - Disse o rapaz.
Kuroi arrancou o punhal da mão de Genji e guardou-o consigo.
-É melhor ser eu a guardar isto. - Depois, agachou-se junto dele, cerrando um punho. - E da próxima vez que tiveres a ideia infeliz de tentar um golpe sujo como envolver nisto humanos que não têm nada a ver com os nossos assuntos, acredita que não vou ser tão condescendente.
Voltou a levantar-se e virou-se para Sochin e Makoto.
-O que queres dizer com "humanos", senpai? - Perguntou Makoto, olhando-o nos olhos.
Kuroi sorriu com o ar mais natural do mundo.
-Então, parece que me esqueci mesmo de vos contar... Bem, vamos pôr as coisas deste modo: eu não sou exactamente humano... e o mesmo se aplica a este idiota.
Genji soltou um grunhido.
-C-como assim? - Indignou-se Makoto, incrédulo. - Quem... o que são vocês?
Kuroi tirou o chapéu e coçou a cabeça, pensando na melhor maneira de responder.
-Bom, para resumir... Somos aquilo a que vocês humanos normalmente chamam... monstros.
Ao ver as expressões perplexas dos dois, não conseguiu evitar uma pequena gargalhada. Voltou a colocar o chapéu e foi caminhando à frente para a saída do beco.
-Mas não totalmente. Eu, por exemplo, sou meio humano. - Continuou, enquanto andava. - Venham, explico-vos quando chegarmos.
Os dois irmãos entreolharam-se, meio desconfiados, largaram-se e seguiram-no com passadas tímidas.
-E quanto à recompensa...? - Perguntou Sochin, tentando mudar o assunto. - O que vais fazer?
-Nada. - Respondeu Kuroi. - Se por acaso alguém me reconhecer e se intrometer no meu caminho, vai sentir na pele o porquê do valor dessa recompensa.

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